“Se o seu paciente se comportasse assim, o que você faria?”. Essa foi a pergunta que M. Night Shyamalan fez, algumas vezes, a uma psiquiatra que consultou. Ele estava escrevendo o roteiro de “Fragmentado”, que estreia nesta quinta (23/3).
Também dirigido por ele —que comandou outros bons suspenses, como “O Sexto Sentido”, “Corpo Fechado”, “Sinais”, “A Vila” e “A Visita”—, o longa apresenta Kevin (James McAvoy), um homem que tem Transtorno Dissociativo de Identidade: ele possui 23 personalidades diferentes. Dominado por algumas delas, Kevin sequestra três adolescentes. Enquanto elas estão em cativeiro, o protagonista começa a desenvolver uma 24ª identidade, a quem chama de “A Fera”.
O diretor M. Night Shyamalan, que veio ao Brasil para divulgar “Fragmentado” (Foto; Divulgação)
Em interpretação magnífica (leia mais aqui), James McAvoy transita de um personagem a outro. Cada identidade dele tem suas particularidades: algumas são fortes, outras fracas; algumas adultas, outras crianças; algumas têm diabetes, outras não têm nenhum problema de saúde.
Em passagem pelo Brasil para divulgar o filme, M. Night Shyamalan conta que o longa tem embasamento real. “Parece ficção, mas é 99% real”, garante. “Existem casos de pacientes que mudam a química do corpo: algumas identidades mostram glicose ou colesterol elevado, e outras não. Há até casos de pessoas cegas que enxergam, caso a identidade que assume possa ver”. De acordo com o cineasta, a única pura ficção no quadro de Kevin é justamente “A Fera”, que se comporta como um animal.
“Parece mentira, porque é muito estranho, mas essas mudanças realmente acontecem. No filme, há uma referência a um vídeo de um cachorro. Esse vídeo é real”, diz Shyamalan. “Um policial, que nunca deixa o cão entrar na sala, está sentado no sofá. Quando ele muda de identidade, que é um menino, o cachorro entra correndo e começa a lhe lamber o rosto. Não sei explicar, mas deve ser uma troca de energia que o bicho percebe”.
James McAvoy encarna o papel com dedicação: é possível perceber, só pela expressão corporal, quando ele muda de personalidade. “McAvoy é super corajoso”, diz Shyamalan. “Fiquei muito feliz de ele ter aceitado o convite para fazer o filme. Eu precisava de um ator que trouxesse muita empatia aos personagens, que mostrasse o porquê eles precisam existir dentro do Kevin”.
“Fragmentado” demonstra que Shyamalan volta definivamente a fazer suspenses de qualidade. Depois de uma má fase —que foi de “A Dama d’Água” (2006) até “Depois da Terra” (2013)—, o cineasta ganhou força novamente com “A Visita” (2015). Depois de um intervalo tão grande, Shyamalan agora lança suspenses para uma nova geração, que talvez não o conheça. “Fragmentado” foi planejado há 17 anos, mas só desenvolvido agora.
“Nos anos 1990, era tudo mais leve no cinema”, podera ele. “Era tudo mais feliz, com canções em restaurantes e pessoas contentes. Hoje, achamos isso “brega”, mas era o que dominava na época. Foi mais para o fim da década que cineastas mais “obscuros”, como David Fincher [de “Seven – Os Sete Crimes Capitais” e “Clube da Luta”], mudaram esse cenário. Eu jamais poderia ter feito um filme como “Fragmentado”, que tem violência e trata também de sexualidade, há 17 anos”.
M. Night Shyamalan (à esquerda) e o ator James McAvoy (Foto: Divulgação)