‘O Pacto de Adriana’: Cineasta investiga o envolvimento da própria tia na ditadura chilena

De Lissette Orozco, o documentário foi premiado na 41ª Mostra Internacional em São Paulo e estreia em circuito nesta quinta (11/1)


Para se fazer um bom documentário, é preciso, claro, ter comprometimento com a verdade – e um distanciamento emocional em relação aos fatos investigados. Agora, imagine só gravar um documentário depois de descobrir que um parente pode ter torturado pessoas durante a ditadura. É o desafio que a chilena Lissette Orozco enfrentou e que resultou em “O Pacto de Adriana”, que foi premiado na Mostra Internacional de Cinema em SP e que estreia nesta quinta (11/1) no CineSesc, na capital paulista.

Liss, como a cineasta é chamada, começou a gravar o documentário quando ainda era estudante de cinema. Ela conta que, quando era pequena, sua tia Adriana trabalhava para as Forças Armadas – o que era motivo de orgulho para toda a família. Mas, um dia, a mulher é presa, e Liss descobre a verdade: sua tia é acusada de ter trabalhado para a DINA, a polícia do ditador Augusto Pinochet no auge de seu regime autoritário.

Lissette Orozco e sua tia, Adriana, em cena do documentário (Foto: Divulgação)

Com as acusações, Adriana se muda para a Austrália. Mas, à medida que as investigações avançam, ela corre o risco de ser extraditada do país para que compareça ao julgamento no Chile.

A sobrinha Liss é uma das únicas familiares que continua a manter contato com Adriana, além de sua outra tia e de sua avó – toda o resto da família cortou relações com a acusada. A cineasta passa a filmar todas as conversas que tem com a tia por Skype: nessas situações, Adriana lhe pede favores, como pedir para que convença antigas colegas de trabalho a afirmarem que ela nunca esteve no quartel de Pinochet.

Durante anos (e durante todo o documentário), Adriana jura que não participou de torturas. Segundo ela, apenas fazia trabalho de secretária no governo. Liss, porém, segue o protocolo da produção do documentário e procura pessoas que estiveram no quartel do ditador. O que fazer quando sua tia chora e diz que não era torturadora, mas outros dez entrevistados dizem o contrário?

Um dos melhores trunfos de “O Pacto de Adriana” é ter sido filmado ao longo de vários anos. A qualidade de filmagem (tanto de enquadramento, som e imagem) vai claramente melhorando à medida que Liss se torna mais profissional e consegue uma equipe para ajudá-la – é bem legal notar o avanço da cineasta. Outra coisa que vai mudando ao longo do tempo é justamento o relacionamento com sua tia: no começo, Liss acredita nela e está disposta a ajudar; porém, quanto mais escuta outros depoimentos, o relacionamento começa a se desgastar.

Lissette Orozco mostra profissionalismo em deixar claro que tem dúvida quanto à inocência da tia. É claro que ela gostaria que a mulher fosse inocente, mas Adriana, por vezes, tem comportamentos que a comprometem, como quando pede para que Liss “faça ameaças” se antigas colegas de trabalho se recusarem a testemunhar em favor dela.

“O Pacto de Adriana” tem um resultado incrível mesmo sendo duplamente difícil para Lissette: fala de uma ferida feia (e recente) na história do Chile e também na história de sua própria família.

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