Perrengues durante a pandemia, ídolos, trilha sonora e mudanças de vida foram alguns dos assuntos abordados durante o bate-papo entre a atriz Paula Braun e a cantora Roberta Sá. Elas participaram do projeto 5 por 5, do Culturice, que tem como proposta fazer com que duas personalidades se entrevistem, colocando em jogo qualquer assunto.
O projeto 5 por 5 tem como objetivo estabelecer diálogos ricos e interessantes a partir da conexão entre diferentes áreas, gêneros, experiências e pensamentos. Sempre teremos a participação de duas personalidades, e cada uma fará 5 perguntas para a outra, sobre qualquer assunto – dá para falar sobre arte, política, filosofia, família, sentimentos, sociedade, o que for. Por isso, a curiosidade não fica apenas em relação às respostas, mas também em saber quais serão os questionamentos elaborados pelos participantes.
5 por 5: Fabio Porchat e Maitê Proença
5 por 5: Fabiula Nascimento e Fabrício Carpinejar
5 por 5: André Abujamra e Maria Manoella
Paula Braun é uma artista com carreira cinematográfica premiada, com troféus de melhor atriz por filmes como o longa “O Cheiro do Ralo” e o curta “Maridos, Amantes e Pisantes”. Na TV, participou de novelas como “Malhação” e “Amor à Vida”, e no teatro, mais recentemente, esteve em cartaz com “Creme do Céu”, em 2019. Ela estreia na direção cinematográfica logo mais, em agosto, quanto estreará na plataforma Globoplay seu documentário “Ioiô de Iaiá”. Com mais de 5 anos de produção, a obra mostra a relação de sete casais que estão juntos há cerca de 50 anos.
Roberta Sá entrevista Paula Braun
Roberta – Como você enxerga o impacto das redes sociais no processo criativo do ator? Acha que ajuda, atrapalha, ou ambos?
Paula – Por um lado, tem um diálogo muito rico com o público, adoro conversar, conhecer as histórias das pessoas, ouvir o que elas pensam sobre o trabalho e sobre a vida, eu sou realmente apaixonada por histórias e por pessoas e isso é inspiração e material. Fiz um documentário sobre casais juntos há mais de 50 anos e alguns desses casais surgiram das redes. Essa troca aqui é imensa.
Por outro lado, e nesses tempos, a gente acaba conhecendo o lado sombrio que as pessoas escondiam e hoje, fortalecidas, não tem mais pudor de mostrar… a internet é uma caixa de surpresas e trouxe o mundo todo, diverso e de bandeja. Rico e perigoso. E é uma dispersão só. Às vezes entro com um objetivo e quando vejo estou comprando uma blusa rs.
Roberta – O que mudou na vida de uma atriz de quando você começou para hoje em dia?
Paula – Nossa, tanta coisa. Eu comecei com uma visão tão romântica da profissão. Eu estudei teatro em São Paulo, fiz peça no Arena, vi o cinema brasileiro se reerguer com força, foi tudo tão bonito. As dificuldades sempre existiram, sempre, mas agora vejo tudo em conflito. Teatros fechados (mesmo antes da pandemia já tínhamos uma crise), vejo a produção cinematográfica decaindo, desemprego no setor… uma tristeza. Nesse ponto as redes são acolhedoras! A gente teve que se reinventar.
O futuro ainda é uma incógnita pra mim, será que voltaremos ao que éramos em termos de shows e apresentações? Como fica a pandemia? Vai ter fim? Altos e baixos? É tudo tão rápido que não tem como prever. De qualquer forma, a gente sempre dará uma volta e meia e acabará fazendo o que nos cabe, contar a história de forma colorida, cinza, sonora e visual.
Roberta – Quais suas maiores referências?
Paula – De referências artísticas, sou muito fã da Miranda July, que escreve, dirige, atua… gosto muito do olhar da Sofia Copolla, gosto demais de tudo o que a Björk faz. Conceição Evaristo é a minha grande leitura do momento, e desde que ouvi Nina Simone cantando entendi o que é colocar na arte o que tem dentro, de dentro pra fora.
Agora, tenho as referências que eu adoro, e são pequenas (e por isso imensas), de pessoas que atravessaram a minha vida de forma tão doce… Aquele dono da bodega que a gente ia de criança comprar leite, a mãe da amiga que ficava de sutiã no calor infernal de Blumenau, a professora que me disse “teu caminho está traçado”, a vizinha que brigou comigo quando brincamos na areia da obra dela, a menina no jardim de infância que dividiu um doce que esticava muito e a outra vizinha que gritava “telefoneeee pra tua mãaae”, seguida de correria. Essas lembranças de pedacinhos picotados da vida viram referências que voltam sempre, na vida e na obra, e dão aquele quentinho na vida.
Roberta – Como você avalia a mudança da TV aberta para o streaming?
Paula – Eu acho um caminho natural para a televisão, e acho ótimo que tenhamos concorrência, várias produções em andamento, é um mercado maravilhoso que vem se abrindo nestes anos. Pra nós profissionais é muito bom. Em relação ao cinema eu sou mais conservadora kkkk. Para mim nada será tão incrível quanto uma boa sala de cinema. Me preocupa também a seleção desses streamings, acho as opções de produção muitas vezes parecidas e tem o famoso e temido algoritmo. Vão sempre te mostrar aquilo que você costuma ver, é pratico, mas limita demais o nosso acervo e acesso as obras.
Roberta – Como está sendo lidar com filhos em casa, homeschooling, manter a sanidade e tudo o que envolve viver diante da pandemia?
Paula – O começo foi terrível. Não tínhamos vacinas, não sabíamos quando voltaríamos e se voltaríamos à então conhecida normalidade. Fiquei arrasada, estressada, depressiva e alcoólica rs. A gente ainda tem o fator Brasil que não é nada fácil. Quando surgiu a vacina surgiu também um naco de esperança.
As crianças aos poucos retornaram às aulas presenciais, os professores foram vacinados com a primeira dose, alguns com a segunda, entendemos qual máscara funciona, qual teste tem melhor eficácia, voltamos a gravar, a ensaiar, a sair, mesmo que o mínimo possível e sem aglomerar. E que saudade de aglomerar! De um show, um bloco, uma festinha. Me falta o contato, os encontros assíduos, os abraços sem medo, o sambinha no bar. Sinto muita falta do teatro, do palco, choro quando lembro e choro mais ainda quando vejo a quantidade de pessoas órfãs de mãe, pai, filho, avós. O arrombo que essa pandemia causou.
Se aprendemos sobre algo foi sobre a tristeza. Ainda não é fácil. Mas eu sou taurina e teimo em ser otimista. O otimismo é minha tábua de salvação, junto dos meus filhos, amigos, afetos e bichos. Eu creio em Chico, vai passar.
Paula Braun entrevista Roberta Sá
Paula – Antes da fama e de começar a cantar profissionalmente, quem era seu grande ídolo, com quem você sonhava (ou sonha) em fazer parceira? E se já fez, como foi?
Roberta – Tinha muitos ídolos. Que permanecem no meu pódio até hoje. Como João Gilberto, Elis Regina, Elza Soares, Cartola, Dona Ivone Lara e por aí vai. Sonho em cantar com o Caetano Veloso. Já estive com ele em diversas ocasiões mas nunca tive a chance de cantarmos juntos.
Paula – O que você acha que a pandemia trouxe a você no sentido de mudança? Algo que vá levar para sua vida e personalidade.
Roberta – Fomos obrigados a desacelerar, a repensar como levávamos a vida. Comecei a nadar no mar e estabeleci uma rotina mais saudável. Mas creio que o maior aprendizado é saber lidar com emoções como medo, raiva e a impotência diante da barbárie em que estamos vivendo. Lidar com essa tristeza profunda e buscar todo dia um pouco de esperança é uma tarefa muito difícil no Brasil nesse momento.
Paula – Qual seriam as cinco músicas que fariam parte da trilha sonora da vida de Roberta Sá?
Roberta – Só cinco? É muito pouco! Cada fase da vida tem sua própria playlist. No momento tenho escutado “Maior”, com Dani Black e Milton Nascimento, “Oxum”, com Xênia França e Serena Assumpção, “Apesar de Você”, de Chico Buarque, “Gente Aberta”, de Erasmo Carlos, e “Muito Obrigado Axé”, com Maria Bethânia e Ivete Sangalo.
Paula – Se Deus te desse uma máquina do tempo e te permitisse voltar a alguma época da sua vida, para qual você iria e por quê?
Roberta – Eu iria bem pro comecinho da minha carreira, pra poder aproveitar melhor aquele momento em que tudo é novidade. Sou uma pessoa hoje muito mais capaz de aproveitar o momento presente.
Paula – E se o mundo todo e toda a sua população parasse pra te ouvir e de fato te ouvisse, qual o recado que você daria?
Roberta – Falaria para a população que não adianta nada estar tudo bem com você se não está bom para todo mundo. Se não tiver vacina para todos, nada vai funcionar.